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Floreando, por Milton Lodi 18/10/2012 - 10h00min
CLUBES DIFERENTES
Como de hábito, no mês de novembro de cada ano, devem ser publicados os calendários clássicos dos principais clubes brasileiros promotores de corridas.
O do Jockey Club Brasileiro e o do Jockey Club de São Paulo provavelmente não devem apresentar alterações maiores. O do Rio, desde que passou à responsabilidade do hipólogo Marcos Araújo Ribas de Faria, atingiu um altíssimo padrão, e ano a ano sofre pequenos toques em função da modernidade, da necessidade de permanente atualização. O de São Paulo, após muitos anos sendo pautado pela tradição, com a nova Diretoria paulista sofreu profundas modificações, e para melhor.
Mesmo com toda boa vontade, com todo o respeito dos dirigentes dos dois clubes, há divergências culturais, há entendimentos não coincidentes. Um deles diz respeito às joquetas. Há alguns anos, os clubes brasileiros acordaram em dar 2Kg de vantagem para as joquetas, como forma publicitária e promocional, em tese atraindo para a atividade, que é normalmente só de homens pequenos. Além disso, homens e mulheres vêm aumentando de altura e peso em todo o mundo civilizado, além de viverem cada vez mais tempo. Dentro do turfe, quando os meninos se apresentam para tentar a profissão, são de tamanho e peso adequados, mas muitos têm que desistir, pois nos anos iniciais nas escolas profissionais mantidas pelos clubes, recebem de graça casa, comida, roupa lavada, e com o adequado acompanhamento de instrutores, professores e cuidados médicos. Com isso, meninos quase sempre oriundos de condições modestas, que chegam pequenos e leves, vão aos poucos crescendo e ganhando peso, ultrapassando os normais–limites impostos pela natureza, isto é, homens pequenos e leves. Essa é uma das fundamentais características da atividade. Um menino que chega ou demonstra que vai chegar a pelo menos 1,90m de altura, deve se encaminhar para jogar voleibol, pois com 1,80m já é considerado baixo. Quem pesa 60Kg para mais deve procurar natação, tênis, luta livre, halterofilismo, remo, futebol, esgrima ou outra atividade esportiva. As escolas de jóqueis do Rio e de São Paulo têm que ser severas quando recebem pretendentes, pois é comum meninos chegarem com altura e peso adequados e, em função dos “bons tratos” e dos exercícios, ultrapassarem os limites físicos adequados à profissão. Dentro desse enfoque abre–se um espaço para as meninas, que em termos médios são menores e menos pesadas que os meninos. Assim, além dos meninos que chegam das canchas retas e daqueles que vêm do Nordeste, de um modo geral menores do que os do Sul, as meninas começaram a participar. Com a novidade, que resultou na prática em atração para o público turfista, surgiu a ideia de dar às joquetas uma descarga de 2Kg. Expressões femininas como Marina Lezcano (Argentina), Julie Krone (Estados Unidos) e Suzana Davis (Rio Grande do Sul, Brasil), que respectivamente chegaram a ganhar o Pellegrini, ganhar a estatística, e a brasileira a uma qualidade e um sucesso acima da grande maioria dos jóqueis, por exemplo, não precisaram nenhuma vantagem para enfrentar os homens, além do que as corridas são de cavalos e éguas e não de jóqueis e joquetas. Mas vieram os 2Kg promocionais e, assim funciona no Brasil.
Com o correr do tempo, com o aumento do número de joquetas, as coisas começaram a se modificar, a se alterar. Apenas como dois exemplos, em São Paulo a joqueta gaúcha Josiane Gulart é um dos grandes destaques, terminando a estatística paulista de 2011/12 em 2º lugar, e na atual é a líder, sendo por muitos, entendida como o melhor jóquei–joqueta dentre os quatro melhores paulistas (J.Gulart, V.Leal, A.C.Silva e F.Leandro). No Rio, Marcelle Martins é bem pequena e leve, tem menos de 49Kg, como joqueta–aprendiz fez jus às descargas naturais de aprendizado (4, 3, 2 e 1Kg). Com isso, quando de 4ª categoria, levava os 4Kg como aprendiz e mais 2 como mulher, isto é, 6Kg de vantagem, desequilibrando os páreos, que são enturmados por sexo, idade e número de vitórias, em função de um necessário teórico equilíbrio de forças em cada turma. Mas a extraordinária diferença de peso, aliada às qualidades da joqueta, a levaram à liderança na estatística carioca, chegando a ganhar 4 páreos no mesmo programa, em função dos interesses dos treinadores e proprietários, em aproveitamento da descabida vantagem.
O Jockey Club Brasileiro tomou a iniciativa de normalizar o assunto, mantendo o atrativo, mas descontando a despropositada diferença. Resolveu, e o fez muito bem, mantendo todos os aprendizes, meninos e meninas, igualmente com as tradicionais vantagens de 4, 3, 2 e 1Kg em função das categorias no aprendizado, mas quando não mais aprendizes, as meninas contarão com 1Kg de vantagem. Assim, durante o aprendizado, tudo igual, e a partir de concluído o aprendizado, 1Kg para as joquetas. Ficou bom. Mas o Jockey Club Brasileiro ainda não publicou a respectiva resolução, já que entendeu de ter o Jockey Club de São Paulo como parceiro no novo enfoque. Mas não encontrou concordância. São Paulo não concordou, pensa diferente, em que pese a boa vontade dos dois lados, é apenas uma divergência de opinião.
É necessário ser lembrado que essa vantagem de peso para as joquetas é coisa de brasileiro, em nenhum lugar do mundo há a tal vantagem, isso não é encontrado em nenhum Código de Corridas no mundo inteiro e, no Brasil, essa novidade é caso para uma simples resolução regional ou, quem sabe, no máximo em um apêndice regional. A solução para o caso Rio–São Paulo é simples, caso não haja mesmo concordância, São Paulo manteria os tais 2Kg, inclusive no aprendizado, como hábito e o Rio inovaria, no entender geral carioca, com apenas 1Kg e só para joquetas não aprendizes. Essa discordância de entendimento é muito natural, o turfe paulista sempre foi mais tradicional que o carioca. As Comissões de Corridas de São Paulo sempre foram mais rígidas, mais intransigentes, mais severas que as do âmbito carioca.
Não há mais porque esperar, São Paulo já teve tempo suficiente para concordar com o Rio, o seu entendimento é completamente respeitável, e o Rio deve seguir o seu próprio bom senso, isto é, publicar desde logo a sua nova interpretação, que é lógica e mais adequada.
São dois turfes amigos, com respeito mútuo, mas cada um é cada um.

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