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Colunista:

Floreando, por Milton Lodi
16/02/2012 - 10h44min

CURIOSIDADES V

Em um G.P. Brasil, Luiz Rigoni montava Coaralde, um cavalo de padrão clássico, filho de Coaraze e Aldebarã Princess. O número de concorrentes não era pequeno e havia um grupo menor de boxes acoplado no partidor maior. Coaralde e mais quatro estavam no grupo menor, acoplado. Dada a partida, as portas dos cinco boxes de fora não abriram, a conexão entre os dois blocos de partidores não funcionou, os do bloco maior largaram normalmente e os de menor ficaram presos. O G.P. teve como vencedor um bom chileno, Cencerro, que ganhou com autoridade. Os cinco que não largaram voltaram sem ter corrido. O Rigoni ficou zangado, e foi reclamar na Comissão de Corridas, o páreo teria que ser anulado e corrido outra vez com todos os boxes dos dois partidores funcionando normalmente. Mas isso não foi levado em conta, o páreo foi confirmado, as reclamações não surtiram efeito e a irregularidade foi mantida. Lamentável.

Hechizo era um alazão argentino, de cara bem branca e olho branco, de vaca, que tinha um gênio ansioso. Ele era manso, tinha bom temperamento, mas dentro do seu box ficava ansioso, andava. Em um último páreo na Gávea, domingo, ele correu como favorito e chegou em último. O Dr. Adhemar de Faria, que orientava os treinamentos e inscrições dos animais aos cuidados do treinador Claudemiro Pereira, determinou que Hechizo deveria ficar preso no box, sem sair para nada, durante todo o espaço de tempo entre o último lugar e a corrida seguinte, que seria no domingo próximo, sete dias depois. O raciocínio era no sentido de que, com a ansiedade e a movimentação exagerada dentro do box, Hechizo não precisava de mais trabalhos. Hechizo só saiu do box uma semana depois, foi direto para o prado, e venceu muito bem. Naturalmente, o treinador foi imediatamente suspenso por diversidade de performances. Depois de ganhar muitas corridas e chegar aos 7 anos de idade, em época que a lei determinava um limite na idade para correr, Hechizo foi para um pequeno Hipódromo em Belo Horizonte, em área conhecida como Goiabeiras, na verdade um terreno desabitado, limítrofe com um quartel. Lá o meu pai mantinha cerca de oito cavalos, todos velhos, mas ainda em condições de correr. O clube era paupérrimo, os seus programas tinham sempre 4 ou 5 páreos, normalmente com 4 competidores em cada um. Os páreos iniciais eram de mestiços, o penúltimo de puros, quando o meu pai tinha sempre uma parelha, e no último os quatro corredores eram os melhores da Vila Hípica, todos do meu pai. Hechizo correndo em nome dele e os outros nos nomes de parentes e amigos. Naquele último páreo o meu pai não recebia os prêmios, eles ficavam para o clube, e Hechizo manteve–se invicto com um rosário de novas vitórias. O tal último páreo só servia como espetáculo, pois as apostas nem contavam pela superioridade do Hechizo, sempre ganhando todas, mas as notícias das vitórias davam grande prazer ao meu pai. Hechizo e Manguarí foram responsáveis pelas maiores alegrias turfísticas do meu pai.

Bertrand Kauffmann e José Luiz Pinto Moreira estavam na França, e viram um bonito e bom cavalo que era igual ao pai Shantung. Tanto o hipólogo como o veterinário gostaram tanto do cavalo que resolver contatar no Brasil o então titular dos Haras São José e Expedictus, Francisco Eduardo de Paulo Machado. Francisco Eduardo pediu ao hipólogo John Aiscan, que estava na Inglaterra, que fosse ver o tal cavalo, e com a aprovação, o cavalo foi comprado e trazido como reprodutor, constituindo–se com Formasterus e Fort Napoleon a espinha dorsal masculina do vitorioso haras, um formidável tripé.

Mamoré era um grande velocista, bi–campeão do G.P. Major Suckow, o páreo de velocidade em 1.000 metros corridos na Gávea no sábado, véspera do G.P. Brasil. Muitos animais velozes e, mesmo, alguns de distâncias maiores tentaram vencê–lo, mas Mamoré à época era imbatível em 1.000 metros. Em um dia de inscrição, quando Mamoré iria tentar, e certamente ganhar o Suckow pela terceira vez, o seu proprietário, José Bastos Padilha, passou cedo na cocheira para ver o seu cavalo e conversar com o treinador. Padilha era um homem metódico, muito trabalhador, firme em suas decisões, era um empresário que foi o melhor Diretor de Hipódromo do Jockey Club Brasileiro em todos os tempos e, era ainda, dono da Revista Vida Turfista. Participava ativamente do turfe carioca, era ainda, criador de sucesso no município de Castro, no Paraná, com a sua Fazenda Santa Ângela. No tal dia da inscrição, José Bastos Padilha foi à tarde saber do campo do páreo do Suckow, e para sua grande surpresa não constava o nome do Mamoré. A Comissão de Corridas informou que ele não tinha sido inscrito. Padilha telefonou então para o treinador, que disse ter entendido que a inscrição ficaria por conta do Dr. Padilha. A José Bastos Padilha, criador e proprietário, Diretor do Jockey Club Brasileiro, só restou ficar inconformado, naturalmente, Mamoré não correu.

Um caso de inscrição também ocorreu comigo, mas de forma diferente. Eu me encarreguei de colocar na urna a inscrição de uma potranca maravilhosa que iria estrear. Era uma importada no ventre, filha de Galgador e Hypanis, por Jock, que mesmo sempre trabalhando sem maiores rigores mostrava–se um animal superior. No dia seguinte de manhã, não tendo a inscrição da Berceuse constando da relação dos inscritos fui falar pessoalmente com o então Diretor encarregado do setor, José Moreira da Fonseca. Ele foi muito delicado, disse que a potranca não tinha sido inscrita. Eu refutei, eu mesmo, pessoalmente, havia colocado a papeleta na urna. Ele me prometeu que ia mandar verificar, que eu telefonasse à tarde. No telefonema, o Diretor disse que haviam encontrado a papeleta, ele me pediu para que deixasse a inscrição da potranca para a outra semana. Eu não concordei, pois o meu pai estava no haras aguardando com ansiedade a estréia da boa potranca. José Moreira da Fonseca, então, mandou incluir o nome de Berceuse no programa. A potranca, de nascimento em tempo europeu, ainda antes de completar 3 anos de idade, estreou vencendo facilmente e batendo o record dos 1.200 na areia. Três dias depois o meu pai morreu em acidente de automóvel. A vitória espetacular de Berceuse foi a sua última alegria no turfe.



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